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O icónico Círculo de Leitores cumpriu o seu propósito de publicar uma extensa e aprofundada coleção de biografias, tendo não só como ponto de partida e tópico fulcral, mas também como guia para toda a exploração, cada um dos Reis de Portugal. Fazendo as contas à história, são 34 preciosos volumes.
Paralelamente ao lançamento destes ambiciosos trabalhos, o Círculo de Leitores, juntamente com a equipa da Universidade Católica que se dedica ao estudo dos povos e das culturas de expressão portuguesa, organizou um debate centrado nas biografias dos reis.
As obras constituem um verdadeiro arquivo da história portuguesa. São um recurso de excelência para quem desejar obter uma melhor visão geral do desenvolvimento de uma nação, ou recolher detalhes interessantíssimos sobre épocas históricas específicas.
É simplesmente inegável que um ser humano não é apenas o resultado da sua cultura, algo que é digno de frisar para que não se dê azo a generalizações. Mas também é bem verdade que o passado de um povo e de um país ajuda a moldar os seus descendentes, no presente e no futuro.
Daí a relevância da publicação dos 34 volumes biográficos sobre os Reis de Portugal para entender a história e continuar a pavimentar o caminho.
Os olhares que cada um dos autores envolvidos tecem dos monarcas portugueses são profundos, críticos e analíticos. Na coleção, discutem-se as qualidades, as fraquezas, os sucessos e os fracassos de cada rei. Exploram-se os seus traços de personalidade e de intelecto.
E claro, abordam-se ao pormenor as suas ações governativas no âmbito de cada um dos tipos de poder que detinham. Cada uma das obras é pautada pela seriedade, objetividade e alcance da investigação. A coleção “Reis de Portugal” é uma autêntica referência.
Estas três obras literárias de excelência são ótimas recomendações para o seu verão, ou para serem exploradas e dissecadas em qualquer outra altura.
Apenas Uma Narrativa, António Pedro
António Pedro foi uma figura ímpar da cultura do século XX em Portugal. Foi um prolífico escritor, produzindo poemas, romances, ensaios e peças.
Dedicou-se também às artes plásticas, nomeadamente à pintura, à escultura e à cerâmica. Foi verdadeiramente um homem de vários ofícios.
No final da década de 1930, António Pedro tornou-se talvez o derradeiro pioneiro do surrealismo em Portugal, sendo o seu trabalho literário e artístico marcadamente simbólico e experimental.
Apenas Uma Narrativa foi publicado pela primeira vez em 1942. É nada menos do que o romance inaugural do surrealismo português. A densidade de imaginação transbordada nas páginas da obra é realmente fascinante.
O Espelho que Foge, Giovanni Papini
O Espelho que Foge é uma coleção de contos de fantasia da autoria do mestre italiano Giovanni Papini, editada e lançada pela Editorial Presença. No âmbito desta reunião de dez contos podemos enfatizar três nomes. Franco Maria Ricci idealizou, Jorge Luís Borges dirigiu e Maria Jorge Vilar de Figueiredo traduziu.
Giovanni Papini inspira-se no estilo das parábolas e, em todos os seus contos, explora a melancolia e a desesperança. Os seus trabalhos são retratos crus, mas envolventes, que convidam à reflexão sobre as dificuldades e a brevidade da vida.
Salammbô, Gustave Flaubert
Esta pérola datada de 1862 foi um marco de inovação literária, tanto pelas suas descrições de violência, como pelos estilos e técnicas que acabaram por ser amplamente adotados no contexto do realismo.
A protagonista, Salammbô, é filha de um general das tropas cartaginesas, e é o centro de uma história que pinta quadros da agressividade humana e explora o fascínio da humanidade pela violência como entretenimento.
Os tópicos delicados relacionados com a vida são inevitavelmente, não só em Portugal, como em inúmeros outros países, um palco para a defesa das opiniões mais variadas e divergentes. Basta pensarmos nas temáticas do aborto, da eutanásia ou da clonagem.
No entanto, há um tema relacionado com as questões da vida que parece gozar de uma posição unânime entre todos os portugueses ou, pelo menos, entre a esmagadora maioria. Falamos da pena de morte.
A resposta geral, clara e rápida para este tópico é um redondo “Não”. Não queremos sequer pensar que a pena de morte possa estar estabelecida num país que se apelide de desenvolvido. Todavia, esquecemo-nos por vezes de que essa sentença ainda é praticada em vários estados americanos.
Em terras lusas, o processo de abolição da pena de morte é herdeiro de um fenómeno anterior. No Império Português, instauraram-se medidas para garantir uma execução mais misericordiosa. Essas disposições eram mesmo chamadas de Misericórdias.
Foi instituído o hábito de que, se a corda da forca rebentasse e o condenado caísse vivo, era-lhe concedido não só o perdão, mas também a liberdade. Consta até que, várias vezes, quem fornecia as cordas passava-as de antemão por água para que rebentassem com facilidade e menos execuções fossem levadas a cabo.
A 5 de julho de 1852, foi abolida, em Portugal, a pena de morte para crimes de cariz político. Em 1867, foi abolida também para os crimes civis. Muitos conhecem este facto, mas aqui fica para quem ainda não está por dentro: Portugal foi o primeiro estado europeu a proibir a condenação à morte.
E a verdade é que, mesmo sem legislação de apoio, nenhuma pena de morte foi aplicada em Portugal desde 1846.
É simplesmente racional concluirmos que o pensamento tradicionalista e a ideologia progressista são claros e completos opostos, certo? Bem, na verdade, se analisarmos a fundo, o tradicionalismo e o progressismo apresentam uma curiosa relação de simetria. Como assim?
O quadro mental que, tanto os tradicionalistas, como os progressistas, pintam da história e da evolução das sociedades assenta numa lógica muito similar. O que sucede é que essa lógica segue em direções distintas para os dois grupos. Passemos a explicar.
Para os tradicionalistas, aquilo que é bom na humanidade foi deixado para trás, no início do caminho. Para os progressistas, é a derradeira meta, o ponto final no percurso. Para os primeiros, as sociedades afundam-se cada vez mais e de forma irreversível. Para os últimos, a realidade é cada vez mais radiosa e promissora à medida que avançamos.
Ironicamente, a visão que uma grande parte dos elementos de qualquer um dos dois grupos alimenta sobre o mundo é marcadamente irrealista e passiva.
Os tradicionalistas focam-se em enaltecer e mitificar uma era de ouro da civilização humana à qual nunca mais poderemos retornar. Esforçam-se por sublinhar que a decadência do mundo atual se deve ao abandono dos valores tradicionais e que qualquer ação prática para melhorar a conjuntura dos tempos é inútil e infrutífera.
Quanto aos progressistas, o seu fascínio pela marcha constante da humanidade rumo ao progresso faz com que, muitas vezes, nutram uma perspetiva demasiado confiante e otimista no que toca ao futuro. Essa visão previne-os de empreender esforços reais que contribuam para a resolução dos problemas que inegavelmente ocorrem no momento.
Então, qual é a posição correta? Será que há uma? É necessário encontrar qual o ponto mais benéfico no espetro entre o tradicionalismo e o progressismo. Mas, como o exemplo dos dois grupos ajuda a entender, mais do que refletir e idealizar, é preciso agir de acordo e não se deixar deslumbrar por visões demasiado vincadas do mundo.
Nos nossos tempos, são inúmeros os crentes que consideram não apenas aceitável, mas também necessário, aliar a tradição ao modernismo no que se refere à ideologia e à atuação da Igreja e dos seus fiéis.
Ainda assim, existem pessoas que mantêm uma posição muito mais conservadora e afirmam que, na Igreja, a tradição e o modernismo são incompatíveis. Que base apresenta este grupo para a sua perspetiva quanto à espiritualidade e à religião?
A Igreja Católica tem cerca de 2000 anos como instituição organizada, mas a prática religiosa com base em Cristo tem muitos mais. Ora, é inevitável concluir que a fé, a crença e a doutrina cristãs estão profundamente arraigadas na tradição e dependem dela para a sua continuidade e transmissão fidedigna de geração em geração.
Qualquer crença, assim como é o caso da fé religiosa, está assente em pressupostos fundamentais, sejam eles valores, ensinos ou comportamentos. No contexto da doutrina católica, esses pressupostos são muitas vezes chamados de dogmas.
Por essência do próprio conceito, os dogmas são imutáveis. Se são imutáveis fazem parte de um universo estabelecido de tradição. Sim, a manifestação da fé através de celebrações passa por um desenvolvimento orgânico ao longo dos tempos. Mas os princípios basilares não podem ser apagados, nem novidades doutrinais podem ser introduzidas.
Mas, afinal, o que propõem os modernistas? Para aqueles que pretendem incluir os ideais do modernismo na prática religiosa, a fé baseada em dogmas é algo alterável que deve adaptar-se aos ventos de cada época.
Se é adaptável, a fé torna-se múltipla, separatista, confusa e manipulada, fugindo cada vez mais da crença estabelecida por Cristo. Para os mais conservadores, a questão nuclear reside aqui.
Se qualquer sistema religioso se baseia nos ensinos constantes e intemporais de um Deus ou de um profeta, como é possível que os mesmos sejam distorcidos por agentes exteriores?
O russo Pitirim Alexandrovitch Sorokin foi um filósofo, sociólogo e historiador que viveu em pleno os anos da Revolução Russa. Durante a guerra civil, Sorokin foi um ativo contrarrevolucionário e opôs-se à ideologia comunista, factos esses que eventualmente o levaram à prisão, e até mesmo, à sentença de morte.
A verdade é que Lenine acabou por anular a condenação do jovem Sorokin e poupar-lhe a vida. Muitos acreditam que essa decisão adveio do desejo de Lenine de se apresentar como um líder benevolente. De facto, o próprio Lenine escreveu um artigo em que se exaltava por ter permitido que Pitirim Sorokin vivesse.
Ainda assim, Sorokin nunca deixou de ser um ávido opositor do regime. As suas críticas abertas conduziram-no ao exílio. Em 1930, tornou-se cidadão dos Estados Unidos. Aceitou o cargo de professor de Sociologia na prestigiada Universidade de Harvard, e ainda de presidente do departamento da área disciplinar.
Sete anos depois, Sorokin publica os primeiros volumes da obra que inegavelmente pautou a sua carreira de forma mais marcada, Dinâmicas Sociais e Culturas. É nestes milhares de páginas que se revela de forma ampla a ideologia filosófica de Pitirim Sorokin.
Sorokin centra-se no estudo das sociedades e das culturas. Rejeita a teoria da evolução das sociedades como ciclos de vida naturais, mas também as teorias do progresso da humanidade.
Segundo o teórico, as culturas civilizadas não entram em declínio, pelo menos no sentido mais comum do termo, mas oscilam entre diversas fases. Cada uma das fases decorre por centenas de anos.
Nesse período, as culturas são dominadas por uma perspetiva própria e única, integrada em todos os aspetos da sociedade, desde a governação, a ciência e a religião, até às artes plásticas, à música, à filosofia e à literatura.
Em 1580, a coroa portuguesa foi retirada do poderio do ducado de Bragança por Filipe II de Espanha que, como é sabido, se tornou Filipe I de Portugal. Os seus descendentes, Filipe III e Filipe IV mantiveram a posse da coroa de Portugal.
A verdade é que eram os duques de Bragança quem tinha o legítimo direito de fundar uma dinastia régia. Por isso, a 1 de dezembro de 1640, 60 anos depois da usurpação, a Restauração da independência de Portugal sinalizou, se quisermos reduzir o fenómeno à sua forma mais simples, uma restituição da legitimidade do poder em território nacional.
Os monarcas de Espanha juraram respeitar as leis e as tradições de Portugal, mantendo o seu senhorio independente, e apenas unindo a sua coroa às de Castela e Aragão.
No entanto, logo a começar por Filipe II de Espanha, I de Portugal, os compromissos feitos com a nação lusa foram gradualmente sendo postos de lado. Tanto é que, por altura do reinado do seu sucessor, Filipe III, a governação espanhola sucumbiu à tirania, o que continuou a verificar-se na atuação de Filipe IV.
Na década de 1620, estava o Reino de Portugal apagado de forma praticamente total como unidade soberana, e despojado dos seus privilégios correspondentes.
Sendo assim, os esforços empreendidos em 1640 com vista à Restauração da independência do Reino de Portugal tinham como foco o retorno, pelo menos, à situação anterior a 1620, mas idealmente, à forma legítima de Estado arrancada de Bragança em 1580.
A ação das elites intelectuais foi deveras importante para espalhar e manter acesos o sentimento de independência, a identidade nacional e a resistência. Precisamente a partir de 1920, a literatura teve um papel fulcral no enaltecimento das figuras e nos feitos da história de Portugal, enfatizando assim a necessidade de lutar contra a conjuntura.
E que tal recuarmos algumas décadas na história da cultura portuguesa? A viagem será longa, visto que o tópico que queremos abordar impactou Portugal há quase 90 anos, em 1930. No dia 1 de abril, estreava na capital, nos teatros São Luiz e Tivoli, o filme Lisboa, Crónica Anedótica, do icónico cineasta Leitão de Barros.
Na sua arte, Leitão de Barros sempre pautou por exaltar os valores de Portugal com recurso ao seu forte sentido estético. Conseguia assim mostrar a beleza do país, do povo e da terra. A linguagem dos seus trabalhos era apelativa e o seu sentido de humor era realmente apurado.
Tudo isto ficou bem evidente na obra Lisboa, Crónica Anedótica, considerada por muitos como o retrato mais autêntico da capital lusa na história do cinema português.
O elenco de luxo conta com os maiores nomes da representação nacional, incluindo Beatriz Costa, Nascimento Fernandes, Vasco Santana e muitíssimos outros atores de excelência.
A história e as personagens oferecem ao espectador uma intrigante fusão entre realidade e ficção, documentário e paródia. À época, Lisboa, Crónica Anedótica foi nada menos do que um verdadeiro exemplo de inovação, repleto de técnicas, temáticas e ideias que só após a Segunda Guerra Mundial começariam a ser amplamente exploradas noutros países.
O ritmo do filme é animado e as imagens do país são comparáveis a poesia. O que parecia ter a intenção de ser apenas um documentário foi elevado ao patamar de uma das melhores peças da história do cinema português.
O sentimento que Lisboa, Crónica Anedótica produz no espectador é de nostalgia, algo simples, mas poderoso. Lisboa é apresentada como uma cidade alegre, viva e genuína. O filme prova que a identidade nacional e a influência dos tempos serão sempre fenómenos compatíveis.
Num artigo recente, a Alameda Digital abriu a discussão sobre as questões relacionadas com a reprodução artificial, ou reprodução medicamente assistida, que mais suscitam dúvidas, preocupações e opiniões diversas.
Abordámos duas dessas questões: os embriões humanos excedentários e o diagnóstico pré-implantação. Está na altura de colocarmos o foco em três outras.
Reprodução heteróloga
No âmbito da técnica conhecida como reprodução heteróloga, dá-se o recurso a espermatozoides, gâmetas ou óvulos de um dador, uma terceira parte. Isso leva a que, em termos técnicos, a criança tenha entre três a cinco progenitores, o que deixa vários casais inférteis desconfortáveis.
Adicionalmente, a reprodução heteróloga apresenta ainda outra desvantagem no parecer dos críticos, a qual se prende com a fomentação de um comércio, por vezes pouco regulado, de esperma e ovócitos.
Identidade do dador
Ainda no que diz respeito aos dadores, uma das condições fundamentais para a sua existência é o sigilo absoluto quanto à sua identidade.
Este fator inquieta vários pais e mães e fá-los repensar o processo de reprodução artificial. Desconhecerão o indivíduo que contribuiu para a fecundação do seu filho.
E se os pais desejarem ser abertos com as suas crianças e falar-lhes sobre as técnicas a que recorreram? Será que os filhos vão desejar conhecer a terceira parte?
Maternidade de substituição
Esta prática é comummente conhecida como barriga de aluguer. Há quem defenda que o facto de o filho ser vedado do contacto com a pessoa que o gerou no ventre, após ter criado laços afetivos na gestação, pode afetar profundamente tanto a criança como a mulher.
Em resumo, os embriões humanos excedentários, o diagnóstico pré-implantação, a reprodução heteróloga, a identidade do dador e a maternidade de substituição são questões de extrema importância para trazer à mesa nas conversas sobre a reprodução medicamente assistida.
De forma simples, a reprodução artificial, ou reprodução medicamente assistida (RMP), refere-se ao conjunto de procedimentos e técnicas que têm como finalidade permitir que indivíduos ou casais inférteis garantam a oportunidade de ter filhos.
A fecundação pode ser feita exteriormente ou interiormente ao corpo da mãe. De forma geral, a reprodução medicamente assistida é vista como uma resposta viável a uma situação que atinge de frustração e tristeza várias pessoas e famílias, a infertilidade.
Ainda assim, as questões científicas, éticas e legislativas relacionadas com a reprodução artificial continuam a levantar várias dúvidas e a constituir o ponto de partida para debates entre grupos que apoiam diferentes tipos de soluções.
Aqui ficam duas das questões que, se refletidas e discutidas de forma aberta, podem beneficiar e esclarecer aqueles que pensam recorrer às técnicas de reprodução artificial.
Embriões humanos excedentários
Estima-se que para conseguir uma gestação bem-sucedida, é necessário recorrer à criação de até dez embriões em contexto laboratorial, dos quais muitos são congelados e não implantados.
Vários países proíbem a criação de embriões humanos excedentários. Outros permitem-no e usam os embriões para investigação, refinamento de técnicas ou recolha de células estaminais.
Diagnóstico pré-implantação
A partir desta técnica, os médicos ou os pais podem escolher os embriões que, de forma mais completa, preenchem os seus requisitos. A prática do diagnóstico pré-implantação implica a criação, e provável consequente destruição, de embriões excedentários.
As críticas mais comuns a esta técnica remetem para a preocupação com que a mesma abra um precedente para o eugenismo, e para a consideração de que a escolha dos embriões reflete uma relação distante e quase instrumental entre os pais e os seus filhos programados à medida.
Estas são apenas duas das inúmeras questões levantadas pela reprodução medicamente assistida, as quais criam inquietações, tanto entre os críticos, como entre os defensores.